quinta-feira, 16 de maio de 2013

Aprendendo a ler os sinais

Menos de dois dias após o último post, precisei voltar e escrever. É que as palavras têm me perseguido desde a noite passada. Brotam de cada neurônio meu e urgem por serem materializadas. So...


Mesmo quando eu era criança, de alguma forma, eu sempre achei que as coisas aconteciam por um motivo maior. Talvez tenha sido minha base católica – da crença enorme em Jesus Cristo e tudo o que o levou a se sacrificar numa cruz – que tenha me feito pensar dessa forma. Talvez, também, seja esse meu jeito “profundo” de ser, de analisar as coisas, de refletir sobre as causas e consequências do que eu faço, do que os outros fazem comigo, do que eu vejo por aí.

O fato é que por vezes, mesmo com essa minha personalidade e essa minha base espiritual, eu me nego a ler os sinais que a vida me manda. A depender do meu momento, minha tendência é a de entrar numa concha e negar a realidade. Possuo uma tremenda facilidade para inventar um mundo paralelo e, ao longo do tempo, acreditar naquilo que vou criando, ignorando absolutamente todo e qualquer sinal de alerta que me possa ser direcionado.

E o que isto quer dizer? Significa, pura e simplesmente, que eu também vou juntando pedacinhos aqui e ali, galgando migalhas desta e daquela situação ou pessoa, para abastecer esse meu mundinho iludido e – por que não dizer? – de mentira.

Também é fato que essa minha “válvula de escape” vem calcada numa lista já considerável de nãos, rejeições e etc. Convenhamos que cada um lida como pode e como quer com situações assim. Tem gente que joga a toalha e comete suicídio. Tem outros que criam um tremendo muro em torno de si, de forma que ninguém mais consegue conhecer essa pessoa de verdade verdadeira.
 
Tem também aqueles que decidem partir pra cima e deixar de ser vítima para se tornar carrasco e começam a derrubar os outros. Os mais evoluídos simplesmente conseguem pegar o que tem de lição de cada momento e seguir, subindo degrau por degrau. Mas eu não caibo em nenhum destes personagens que citei. Meu negócio é criar o mundo paralelo e me alimentar de ilusão. É meu jeito de me proteger, de me acolher...

De cara no chão
Vez ou outra, alguém vai lá, me puxa pelo dedo mindinho do pé esquerdo e me derruba dessa fábula encantada. E me dá uns tapas na cara e aponta o dedo em riste no meio do meu nariz  e me pergunta aos berros quando é que eu vou deixar de ser idiota, menininha e crescer para encarar as coisas com a realidade que elas exigem. E eu sempre me nego. Me nego, porque dói muito, porque sou obrigada a encarar aquilo que me magoou ou ainda magoa e, sobretudo porque, no auge dos meus 34 anos, eu definitivamente ainda tenho muito o que amadurecer e me equilibrar.

É engraçado... Abrindo um parêntese: agora, tenho a clareza do porquê me tornei jornalista. Eu precisava aprimorar minha capacidade de escrita, uma vez que sinceramente meu coração ‘fala’ por meus dedos. É pela escrita que eu consigo materializar o que vai dentro de mim. E tenho tanta necessidade de colocar para fora o que vai aqui, porque é tão intenso, é tão grande, é tão enorme, que não me cabe, que me faz perder o ar... não consigo manter dentro de mim...
 

Enfim, acho que sou como todos aqueles que desejam ser felizes nesse mundo. Olho para o dia a dia e tenho uma ânsia tão grande de mudar tudo, de ser feliz, de não desperdiçar esse pouco tempo que eu tenho aqui, nessa terra. Ser humano é muito idiota mesmo. Acha que tem todo o tempo do mundo para abrir mão dos imediatismos, das responsabilidades para, enfim, ‘um dia’ ser feliz.
 
No fim das contas, acaba por se moldar numa inflexibilidade de certezas, de convicções que dão aquela falsa sensação de controle... E para quê? Para provar que está certo, que tem razão. O negócio é que razão nunca casou e nunca casará com felicidade. E eu, honestamente, abro mão de ter razão em prol de ser feliz. Danem-se as certezas. Danem-se os caminhos exatos.

Mesmo com a base católica, eu sei muito bem que o que Deus sempre quis é que nós fôssemos felizes, respeitando os demais. É que tivéssemos a capacidade de verdadeiramente nos diferenciarmos das pedras, que não pensam e não mudam, e conseguíssemos nos desfazer, nos desapegar do que nos segura, nos emperra o crescimento, e reconstruir um novo caminho.
 
Sim, porque definitivamente, eu não consigo enxergar o que há errado em mudar de ideia, mudar de rota, admitir que aquilo ou aquele alguém não combina mais com a nova fase de vida. E não. Não quero dizer que as pessoas são descartáveis, porque não são. O que quero dizer é que não vejo o que há de errado em enxergar e admitir que é preciso se reinventar e seguir um novo caminho com ou sem esta ou aquela pessoa.

E é isso o que eu quero pra mim. Quero ter, sobretudo, a coragem de enxergar e admitir que eu preciso de outro rumo, de levantar o rosto escarafunchado do chão, sacodir a poeira e estender a mão, pedindo ajuda. Ajuda para ler os sinais que tenho me negado tanto a encarar. Coragem e sabedoria para recomeçar seja do ponto que for. Coragem para me bancar e admitir minhas fraquezas, minhas limitações, e também minhas qualidades, minhas características exclusivas, meus desejos. Coragem para seguir em frente, construindo histórias, lembranças e novos caminhos. Coragem para recolher meus cacos e criar um molde diferente.

Posso não ser referência para quem quer que seja. Posso ser, aos olhos dos outros, uma ridícula caduca de 34 anos que ainda insiste em não amadurecer e em ser mais assertiva. Mas eu tenho certeza de uma coisa: tudo o que eu sou, tudo o que vai dentro de mim é de verdade e eu admito para quem quer que seja – principalmente para mim mesma. E se amanhã for tudo diferente, que seja diferente então. E admitirei que tudo mudou. Simples assim!

terça-feira, 14 de maio de 2013

O tempo da saudade

Confesso: eu não fui ensinada, treinada, educada para sentir saudades, para sofrer perdas. E também confesso que ainda tenho bem pouco evoluída essa capacidade dentro de mim.

Não ganhar uma partida no jogo de tabuleiro, não ser selecionada num concurso, pegar a cartela mais fuleira do bingo da igreja, perder até na raspadinha... Tudo isso faz parte da vida, mas perder pessoas definitivamente não é comigo.

E quando eu falo em "perder pessoas", não estou falando apenas daquelas que partem desta para uma melhor, como aconteceu com minha querida avó Vicentina, em 2009. Falo daquelas que partem para outro lugar, para outro trabalho, para outra cidade, para outro país. Falo daquelas que, de uma hora para outra, deixam de fazer parte do seu convívio, da cumplicidade da vida diária, para seguirem outro rumo.

É óbvio que fico feliz pela mudança delas. No fim das contas, todos nós buscamos algum tipo de evolução; algo que nos sacie essa contínua inquietação. Mas não posso negar minha tristeza em não ter por perto aqueles que me são tão caros, tão mágicos, tão queridos. Sinto como se um pedaço de mim fosse embora também e dói.

E agora?
Hoje, 14 de maio, estou sofrendo mais uma perda. Mas não é qualquer perda. É a ida de alguém que me tem uma importância absurda. Alguém em quem confio meus segredos, minhas fragilidades, meus sonhos. Alguém com quem possuo uma afinidade, uma identificação, uma cumplicidade sem fim.

É também alguém com quem quebro o pau, discordo, brigo e choro. Alguém com quem troco ideias e dúvidas sobre o trabalho, sobre a vida familiar, social, pessoal. Alguém que eu adoro desde o primeiro dia pela plena capacidade de se superar, pela extrema auto exigência, pela ética, pela generosidade e, acima de tudo, pela integridade. É alguém de uma integridade que eu nunca vi igual; uma pessoa digna de referência e sincera admiração. 

Essa pessoa tem a dignidade de me ouvir, de me aturar nos piores dias da TPM, de também discordar de mim e de me dizer grandes e pequenas verdade na lata, de me elogiar e admirar meu jeito de falar inglês e de palpitar sobre as coisas. É alguém que tem a capacidade de pedir desculpas, quando enxerga que exagerou na mão. Alguém que deseja o meu melhor tanto quanto eu à ela.

É... vai ser duro não te ter mais por perto, pessoa tão querida. Vai ser duro me acostumar à sua ausência, a não almoçar ou tomar aquele lanchinho rápido da tarde com você, falando e ouvindo sobre 398 assuntos ao mesmo tempo...

E agora? Como é que vai ser sem você? Como é que vai ser não te ver mais? Como é que vai ser não ter mais essa sensação sublime de conforto, de "casa", de cumplicidade, de carinho, de bem querer? Para mim, é como você me disse recentemente: "uma amizade verdadeira, que não é apenas de momentos bons, vale muito mais que vários amores".

Espero, apenas, que você leve consigo um pedacinho do que eu tenho de melhor. E que também deixe comigo um pedacinho seu; um pedacinho de todo esse seu bom coração.

Aprendi tanto com você, durante essa nossa jornada juntos. Amadureci tanto a partir das nossas conversas. É... vai ser duro. Mas forte como você é, eu vou seguir em frente. E tudo para também te ver brilhar. Amo-te!

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A vida durante e depois da Philadelphia


Em 11 de fevereiro de 2003, exatos dez anos atrás, desembarquei com a minha recém-amiga Mariana Petrulio na cidade de Newark, em New Jersey. Ambas tínhamos programado nosso intercâmbio como au pairs um ano antes e não tínhamos ideia de que iriamos trabalhar e morar com famílias vizinhas, tampouco o que nos esperaria durante aqueles doze meses que se seguiriam. A gente nunca tinha saído do País.
 
Deixamos nossas famílias para trás, eu deixei meu então noivo de quatro anos, deixamos carreira, estudo, etc., tudo em nome de viver uma experiência que nos traria a fluência no inglês, tão necessária para nos levar mais longe na vida. Naquele momento, a gente não tinha noção de que havia ido mais longe do que jamais pensávamos que iríamos.
 
Eis que, após quatro dias de treinamento numa universidade da região, encontramos nossas respectivas host moms no pátio de um dos maiores shoppings do mundo, o King of Prussia Mall. De lá, partimos para nossas novas "casas" e uma vida nova em folha começou.
 
Confesso que estava assustada. Fui tão determinada a estudar por um ano e voltar para o meu país, sabendo melhor sobre como falar em inglês e acreditando que continuaria a ser a mesma pessoa, retornando para o meu noivo e, dali, iniciando os preparativos para um casamento que, no fim, nunca aconteceu... Aos recém-feitos 24 anos, eu não sabia de nada mesmo...
 
Os três primeiros meses foram péssimos. Era tanta saudade de casa, dos meus pais, do meu noivo, da minha cama, do meu idioma, que eu mal conseguia aproveitar as novidades. Fora a dificuldade em entender as pessoas, as crianças, em gostar daquela comida tão diferente, daquele frio de lascar.... Mas o tempo foi passando e Mariana e eu fizemos amigas - brasileiras, claro!
 
 
Em pouco tempo, Mariana, eu, Mirella e Vanessa nos tornamos um quarteto inseparável e éramos a família umas das outras; aquele laço que nos remetia ao nosso país, às nossas raízes, à nossa base, ao nosso eu mais íntimo. Fazíamos tudo juntas e cuidávamos umas das outras como uma amiga-irmã faria. Aos trancos e barrancos, isso se deu até o final da minha jornada, um ano e meio depois.
 
As melhores pessoas
Assim como minhas amigas queridas, comecei a conhecer pessoas bacanas demais. Brasileiros, americanos, asiáticos, espanhóis, indianos... Minha própria host family, os Quayles, foi a síntese de como é possível se relacionar com alguém completamente estranho e fazer uma amizade para toda a vida, mesmo tantos anos depois e com tanta distância entre um ponto e outro.
 
 
Kathy, minha host mom, sempre foi de uma delicadeza, de uma compreensão, de uma generosidade comigo... Sempre fez questão de me fazer sentir em casa, como parte da família. Sempre apoiou minhas decisões com as crianças. E, ah..., as crianças. Zach, que na época estava com seis anos, e Zoe, com quase dois anos, se tornaram filhos para mim. E, embora tivéssemos nossos problemas de vez em quando, eles me eram tão queridos e tão importantes como só filhos são - o que já posso falar de cadeira.
 
Tive o prazer de viver um ano com eles e de me sentir tão amada como se estivesse em meu país e, de lá, morei com outras três famílias e cuidei de mais oito crianças. Cada uma de um jeito, com sua personalidade, com sua forma de enxergar a vida. Mas os Quayles continuaram a ser minha referência e isso se dá até hoje!
 
Ao longo do tempo, fiz amizade com uma grande turma de brasileiros e foram tantas pessoas queridas que passaram por meus dias americanos... Rogério, Tequinho, Ana Paula, Carol, Juliana, Helida, Betinha linda, Romildo, Daniela, Tulio, Sabrina, Renata, Patrícia, Ricardo, Cláudio, e mais tantos. Cada um fez uma diferença tremenda na minha vida e só eu sei o quanto foram essenciais em momentos-chave da minha vida na Philadelphia.
 
Segunda casa
E o que falar da Philadelphia, a não ser agradecer? Uma cidade ímpar, de uma acolhida fabulosa, cheia de gente jovem de todo lugar do mundo, com movimento, história, belos lugares, ótimos restaurantes e pessoas encantadoras.
 
Philadelphia e eu temos uma relação tão incrível, que sonho com essa cidade. Todo esse tempo depois e fui trabalhar numa empresa que tem filial justamente na Philadelphia. Que tem funcionários que são amigos dos meus amigos brasileiros de lá! Não bastasse, fui ao cinema na sexta para assistir "O Lado Bom da Vida" (título original: Silver Linings Playbook) e aonde o filme se passa? Exato! Na Philadelphia. Deu uma saudade tão grande da minha segunda casa!... Ainda mais porque o filme é incrível e vale cada minuto.
 
De toda forma, acho que sempre terei uma relação diferente com a Philadelphia. Não só porque me acolheu como minha cidade natal e porque foi o lugar em que fiz amigos incríveis e tive um aprendizado imenso. Mas, principalmente, porque foi a cidade em que meu filho foi gerado.
 
Sim, quando embarquei para lá dez anos atrás, eu não fazia a menor ideia de que 18 meses depois traria comigo para o Brasil uma barriga de sete meses, à espera de um garotinho maravilhoso, a quem dei o nome de Lucca.
 
Parafraseando o filme "O Lado Bom da Vida", foi da Philadelphia que tudo o de melhor aconteceu comigo. Foi aonde conheci o pai do meu filho: o Dan DeTora. Nos conhecemos uma semana depois do Halloween e, mesmo não nos vendo há mais de oito anos, continuamos a fazer parte da vida um do outro. Foi por ele que tive a maior benção da minha vida. Meu filho Lucca é para mim o que há de mais abençoado, querido, prazeroso, feliz e saudável. É ele quem traz brilho para a minha vida, dia após dia. E sou muito grata ao Dan e a Deus por isto!
 
Depois que voltei ao Brasil e, dois meses depois, tive o Lucca, minha vida nunca mais foi a mesma. Uma nova etapa começou: a da real maternidade. E, desde então, tem sido uma jornada única, de descobertas diárias, de aprendizado ininterrupto, de um amor que só aumenta a cada dia.
 
 
Sei que ainda colocarei meus pés de novo na Philadelphia. E, desta vez, não estarei sozinha: estarei com meu filho. E sabe-se lá o que acontecerá e o quanto isto nos afetará, quando chegarmos à nossa segunda casa, ao nosso "secret garden".
 
Até breve!